endereçoAv. Brasil, 694 - Centro Faxinal - Pr
telefone(43) 3461-8000
Acessibilidade acessibilidade

infância

Castigo físico reproduz ciclo da violência

Terça-feira, 24 de julho de 2012

Última Modificação: //


Ouvir matéria

Estudo da Universidade de São Paulo conclui que pessoas que apanharam dos pais quando crianças tendem a também bater nos filhos

Cerca de 70,5% dos adultos que apanharam dos pais na infância tendem a reproduzir o comportamento com seus próprios filhos. A conclusão é de uma pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP), divulgada no mês passado. A “violência socialmente aprendida” – abordagem defendida no estudo – demonstra que o cumprimento de leis de proteção da infância, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a chamada Lei da Palmada, em discussão no Congresso, se torna mais difícil no contexto da cultura dos castigos físicos.

A Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar sobre Atitudes, Normas Cul­turais e Valores em Rela­ção à Violação de Direitos Humanos e Violência foi realizada em 11 capitais brasileiras (Curitiba não foi inserida). O estudo foi realizado pela primeira vez em 1999 e repetido em 2010.

Em 11 anos, a parcela de adultos que apanharam dos pais caiu de 79,6%, em 1999 para 70,5%, em 2010. Segundo Renato Alves, um dos pesquisadores do NEV, o dado ainda não é suficiente para atestar que há uma tendência de queda na prática de castigos físicos pelos pais, mas é possível identificar que a violência contra a criança é mais criticada pela sociedade atual. “Hoje, ver um pai batendo em um filho na rua causa repulsa. Há um controle social maior”, afirma.

Alves diz que bater no filho não é algo obrigatoriamente ligado ao fato de o adulto ter apanhado quando era criança, mas ressalta que há uma tendência em se repetir o gesto. Assim, pais que não apanharam na infância têm menos probabilidade de bater nos filhos diante de uma desobediência.

A pesquisa também avaliou a percepção dos adultos quando os filhos se envolvem em brigas na escola. A reação mais comum entre os pesquisados é orientar os filhos a procurar uma autoridade escolar, seja um professor ou um diretor (49,2% das respostas). Outros 5,2% orientariam os filhos a bater de volta e 15,3%, a evitar brigas, mas revidar a agressão caso fosse agredido. “Quando a criança apanha, ela cresce com a visão de que a violência é uma coisa legítima e ela acha formas de reproduzir isso primeiramente na escola”, afirma Alves.

Lei da Palmada

O Projeto de Lei 7.672 de 2010, conhecido como a Lei da Palmada, está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara Federal e ainda não foi aprovado, mas a legislação é uma estratégia defendida pela rede “Não Bata, Eduque” para evitar a continuidade do círculo vicioso demonstrado no estudo da USP.

“Temos no Brasil uma tradição de usar o castigo físico como padrão de educação. Uma estratégia para mudar isso seria termos uma lei apropriada que garanta o direito de as crianças serem educadas sem sofrer castigo ou tratamento humilhante. Só o debate da lei faz com que as pessoas parem para pensar”, defende o secretário-executivo do Instituto Noos, Carlos Eduardo Zuma.

Joyce Pescarolo, psicóloga do Instituto de Educação para a Não Violência e professora e pesquisadora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), critica as agressões graves cometidas contra filhos, mas não tem uma posição definida com relação às palmadas. “A palmada depende do contexto, até porque não existe uma educação que não seja violenta. Tirar a televisão do seu filho como forma de repreendê-lo por algum ato, por exemplo, é uma atitude violenta para a criança”, completa.

Surras podem deixar inúmeras sequelas

Dependendo do local do corpo atingido e da força usada pelo agressor, a surra pode deixar sequelas graves e comprometer o desenvolvimento da criança e do adolescente. “Pode ocorrer a impotência funcional do órgão, cicatrizes, efeitos neurológicos, deficiência auditiva e fraturas”, explica a pediatra do Hospital Pequeno Príncipe Maria Cristina Marcelo da Silveira. O hospital é referência desde 2006 no atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência.

Nos últimos dois anos, houve aumento de 13,3% nos casos de agressões atendidos no Pequeno Príncipe. Em 2010, 330 crianças e adolescentes vítimas de violência passaram pelo hospital. Em 2011, o número passou para 374, ou seja, pouco mais de um caso por dia. Conforme Cristina, 30% dos casos são de vítimas de agressão física e 70%, de abuso sexual. “Em geral, são casos de maus-tratos que mostram a negligência dos pais ou responsáveis”, diz.

Em casos extremos, a situação pode resultar em morte. No último dia 9, em Palmeira (Campos Gerais), uma mãe matou a facadas os filhos de 10 e 7 anos. O Conselho Tutelar do município já havia registrado, em 2007, uma denúncia de maus-tratos contra ela, mas a mãe permanecia com a guarda das crianças.

Os casos atendidos no Pequeno Príncipe são encaminhados à Polícia Civil e ao Conselho Tutelar.

Fonte: gazeta

 Veja Também